NOSTALGIA

Os dias foram se arrastando. Não havia previsão de melhora. Marcos realmente estava pra morrer apesar de não sentir nenhum mal, nenhum desconforto, nenhuma dor sequer; sabia que iria morrer devido ao laudo médico e resolveu aproveitar bem seus últimos dias.

Foi ao shopping, assistiu aos lançamentos, alugou os filmes que marcaram sua infância e adolescência, teve um trabalho danado pra conseguir assistí-los no vídeo pois esses filmes não tinham saído em dvd.

Passou a vasculhar os contatos do celular. Encontrou o telefone de uma de suas ex-namoradas. Mas não qualquer ex-namorada, era a Camila; a que mais o machucou com o término, a que deixou a maior cicatriz emocional.

Não a viu mais depois que terminaram, e já havia quase 15 anos passados desta data.

Lembrou que tinha uma foto deles guardada. Procurou (deu trabaho) mas encontrou no fundo de uma das pastas de documentos e contas pagas. Rememorou os momentos que passaram juntos e notou que não conseguia lembrar dos momentos ruins. Claro, lembrou de um e de outro mas não conseguia entender como e por que eles terminaram. Eram tão felizes juntos. Resolveu ligar:


- Combinados.


Iriam jantar na quarta-feira às 20h num restaurante em Copacabana. Nada demais, apenas um encontro casual para matar saudades, saber o que tem feito, etc...

Na quarta-feira ele já estava pronto pela manhã. Julgou o relógio seu maior inimigo. Passou a tentar adivinhar como ela estaria:

- Deve estar ainda mais linda; talvez mais esperta. Como seria beijá-la depois de tanto tempo? E o sexo?


Perguntas de si para si mesmo com um ar de ironia atrás. Ele lembrou que terminaram por que ele mesmo encontrou outra menina (adolescentes são foda).

Às 20h estava lá. Dez minutos depois, ela chegou com o mesmo sorriso. Mas só o sorriso. Sua pele estava enrugada, a voz estava grave, quase falhando. Parecia resultado de 30 cigarros por dia depois de 10 anos. O cabelo era ralo e fino e ele não lembrava que ela tinha o nariz tão grande. O tempo realmente havia sido cruel.

No meio tempo de ela entrar pela porta e sentar à mesa, algo quebrou dentro dele. Algo impalpável, talvez a fantasia. Talvez as boas lembranças. Talvez aquela velha cicatriz tenha ido embora. E, acreditem, quando uma cicatriz dessas simplesmente vai embora, não é sinal de coisa boa. Aprendemos a lidar com as cicatrizes, a viver com elas, a senti-las e a reagir indiferentemente. Sabemos que elas estão lá e não estamos preparados para perdê-las.


Mas perdeu, pobre Marcos...

Perdeu o tempo raro e precioso. Perdeu sua melhor lembrança da adolescência. O parâmetro que vinha à sua mente quando lembrava da melhor fase da sua vida. Perdeu o gancho que o mantinha preso à Terra. Perdeu a luz que iluminava sua vida... uma simples lembrança; Camila... e nem as insinuações de "querer levá-lo em casa e, quem sabe, uma taça de vinho" afastaram seu espanto.


Depois daquela noite, mais do que nunca, Marcos se viu pronto pra morrer...

Devaneios Poéticos

Fico aqui, à janela, olhando o movimento na rua, fumando, pensando no ontem, no hoje e no amanhã. Mas principalmente no ontem. Devaneios poéticos. Foco na Marina.

"Marina, minha amada Marina. Onde estarás tu a essa hora? Talvez no parque de diversões, quem sabe atolada de trabalho até agora; pode ser ainda (e a mais provável das hipóteses) que esteja deitava, vendo tv, abraçada com o amor da tua vida."

Enquanto eu continuo aqui. Olhando para o tudo e para o nada. Com o olhar distante, o cigarro na mão, numa visão quase poética. A espreita... esperando a... esperando a Flávia! Flávia querida Flávia. Se tu soubesses o quanto não estou contigo estando, me empurraria dessa janela abaixo...

Transtorno de Personalidade

- Patrícia, preciso de um namorado!
- Mas Carla, não faz nem três semanas que você terminou seu último namoro.
- Pois é. Meu trabalho é frustrante, sou uma pessoa estressada. E a hora do meu psicólogo é cara.

Pensou: "Cachorra!"

- Há psicólogos mais baratos, Carla.
- Hum... Quanto você está cobrando pelos seus serviços?

Pensou: "Psicologia é complicado. Ela não quer um namorado, quer apenas um confessionário. Externar as emoções. Meu ganha-pão... aposto que vai querer desconto. Vou jogar o preço para cima."

- Atualmente minha hora está saindo a R$70,00.
- Ah amiga, me faz um desconto?
- R$50,00?
- Feito.

Carla foi tirando as roupas enquanto a Patrícia ia buscar o vibrador.

Ainda saiu mais barato que o psicólogo.

DO QUE FOI ESQUECIDO - PT 2

Foi embora a Flávia.

Veio à minha casa, não muito feliz. Mais ou menos angustiada. Eu escrevia, não dei muita atenção a ela.

Ela pegou seus livros, suas roupas limpas e suas fotos. Chorou, gritou histericamente "eu não mereço" e bateu a porta com força.

Só então eu dei por mim.

Acendi um cigarro e tentei entender.

Olhei em volta e ainda a encontrei no meu guarda-roupas: suas cartas ainda estavam lá. Encontrei-a no bolso da minha camisa: sua foto 3x4 ainda estava lá. Fui ao banheiro, encontrei-a lá também: algumas peças de roupa suja dela ainda estavam lá.

Fiquei atordoado. Simplesmente não entendia.

Entrei no quarto e fechei a porta. Daí então, entendi o que se passava.

Havia um casaco pendurado atrás da porta: encontrei a Sofia.

DO QUE FOI ESQUECIDO - PT 1

Conheci a Sofia na festa do André, bem no começo. A boate estava lotada. Gostei do jeito que ela tropeçou em mim. Foi um ótimo pretexto para iniciarmos o diálogo (aliás, que maneira mais fria de definir o flerte: "iniciar o diálogo"). "Desculpa" ela falou após o tropeço, "Não desculpo, não! Isso não tem perdão!" falei eu logo em seguida. Após isso ela deu um largo sorriso e continuou falando. Deduzi logo que havia condições.

Conversamos por horas, enquanto eu bebia rum e ela bebia chopp.

Durante a conversa, fui saudado rapidamente pela Catarina, amiga da minha namorada, mas nem me preocupei, afinal, não estava fazendo nada demais.

Se embebedou rápido demais para quem bebia chopp. Foi fácil levá-la à minha casa que ficava a quarenta minutos da boate. Pouco tempo depois de fazermos tudo que tínhamos de fazer, ela já estava dormindo.

Acordou às 9h, me acordou em seguida:

- Quem é você? Onde eu estou?

Expliquei tudo, ela se espantou, pegou suas coisas e foi embora. Voltou 10 minutos depois e pediu meu telefone.

Usou o velho truque de esquecer algo. Ela tinha esquecido o casaco dela que acabou ficando lá, da mesma forma que ela deixou. Queria de qualquer jeito voltar pra pegar de volta e não adiantou eu insistir em leva-lo pra ela. Ela queria por que queria pegar pessoalmente.

Me ligou duas vezes naquele dia, três vezes no dia seguinte e queria me ver novamente no sábado. Reclamou que eu não a ligava e eu tive que contar que tinha namorada. Ela se decepcionou.
Mas a gota d'água mesmo foi quando eu quis dizer a ela que não podíamos mais nos ver, que eu amava minha namorada:
- Olha, você tem que entender que... qual é mesmo o seu nome?
- É Sofia, Eden! Sofia! Você realmente é um insensível. Me esquece!
Sofia... belo nome. Quis me ter só para ela. Amor egoísta. Não preciso de mais um.
Ela tinha namorado. Digo "tinha" por que alguém a viu saindo da boate comigo e contou ao namorado dela.

Minha namorada me ligou na quarta. Confirmou que volta na segunda-feira. Perguntou como eu estava e blá blá blá. O velho papo-furado de sempre.

Depois a Sofia me ligou na quinta e ainda na sexta com esperanças de que eu saísse com ela no sábado. Neguei de todas as formas possíveis.
No sábado a Flávia me ligou, a Sofia não.
Sábado à noite, me ligou também a Suzana (ex-namorada que ainda saía comigo). Dispensei a companhia.
No domingo, minha namorada me ligou, a Suzana ligou novamente. O André me ligou pro futebol (dispensei). Nada de Sofia.
Na segunda, minha namorada terminou comigo.
Na terça-feira o telefone não tocou. Nem na quarta. Nem na quinta.
Nada de Flávia, nada de Sofia, nada de Suzana. Nada de Sofia.

Sofia... Sofia... belo nome...